
Diante dos altos índices de violência no trânsito e da falta de acolhimento às vítimas e seus familiares, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) está promovendo nos dias 19 e 20 de maio o seminário “Protocolo pela Vida: Construindo Caminhos para a Justiça no Trânsito”. O evento, com programação híbrida e gratuito, visa debater estratégias para o atendimento humanizado às vítimas e discutir soluções concretas para prevenir tragédias nas ruas e estradas do país.
Segundo dados da Gerência de Estatística de Acidentes de Trânsito do Detran-DF, 191 pessoas morreram no trânsito do Distrito Federal em 2024. No cenário nacional, a situação é ainda mais grave: 6.160 mortes e mais de 84 mil feridos nas rodovias brasileiras, de acordo com a Polícia Rodoviária Federal. Números que representam não apenas estatísticas, mas histórias interrompidas, famílias dilaceradas e uma sociedade que ainda luta para garantir justiça e dignidade a quem sofre os impactos desses crimes.
O seminário é realizado pelo Núcleo de Atenção às Vítimas (Nuav), pela Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb) e pela Rede de Promoção da Mobilidade Sustentável e do Transporte Coletivo (Rede Urbanidade), em parceria com a Secretaria de Educação e Desenvolvimento Corporativo (Secor). Com o objetivo de ampliar o debate e fortalecer redes de apoio, o evento conta com a presença de representantes do Detran-DF, DER-DF, Polícia Civil e Militar, Semob-DF e TJDFT.
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A promotora de justiça Jaqueline Gontijo, coordenadora do Nuav, destaca a importância de sensibilizar as instituições para o acolhimento das vítimas e seus familiares, que muitas vezes enfrentam um processo repleto de burocracia e dor. “As vítimas já estão sofrendo, em luto ou em reabilitação, e ainda am por um processo sem qualquer apoio, sem saber a quem recorrer ou o que está sendo feito. Isso gera um senso de desrespeito e indignidade. O seminário chega para ser um o de mudança dessa cultura”, afirmou ao Correio.
Jaqueline explica que o evento busca construir fluxos reais de atendimento, com protocolos entre instituições, além de propor ações concretas em mobilidade urbana e prevenção. “O Brasil já foi condenado várias vezes pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por não responsabilizar agressores a tempo. Estamos falando de justiça e também de prevenção para que outras famílias não sofram o mesmo dano”, enfatizou.
A juíza auxiliar do TJDFT, Marília Garcia Guedes ressaltou a importância de preparar o Judiciário para receber e amparar vítimas, especialmente quando todas as demais políticas falharam. “O Judiciário não foi historicamente preparado para lidar com o ser humano, mas com o processo. Isso vem mudando com o atendimento a mulheres vítimas de violência doméstica, crianças e adolescentes. Agora é hora de incluir as vítimas de crimes de trânsito nesse cuidado especializado”, declarou.
Na ocasião, o promotor de justiça do MPDFT, Sérgio Gomide compartilhou a necessidade dos processos judiciais terem um olhar especial às famílias. “Muitas vezes, o julgamento acontece e os parentes sequer são avisados. A vítima era apenas uma peça auxiliar no processo, e suas dores eram invisíveis. Isso precisa mudar. São pessoas que precisam ser ouvidas, informadas, e que têm o direito de participar do processo de justiça”, defendeu.
A delegada da Polícia Civil do DF, Anie Rampon ressaltou que a mudança precisa ser também institucional. “É preciso olhar para dentro das nossas instituições e reconhecer nossas falhas. Esse debate é essencial para tocar cada agente público e provocar uma transformação real. A mudança começa no indivíduo para também ser coletiva”, afirmou.
Painéis temáticos
A programação começou nessa segunda (19), às 18h30, com palestra da pesquisadora e especialista em mobilidade urbana Glaucia Pereira, fundadora do Instituto de Pesquisa Multiplicidade Mobilidade Urbana (IPMMU). Glaucia propôs uma reflexão sobre como tornar o trânsito mais seguro e inclusivo, a partir de uma perspectiva de justiça social.
Nesta terça-feira (20), os debates se aprofundaram em três painéis temáticos:
1: A violência no trânsito no Distrito Federal, com nomes como Lúcia Willadino Braga (SARAH), Paulo Saldiva (USP), Leandro Melo Rocha (Embaixada da Suécia) e Fernando Gastal (sociedade civil).
2: A violência institucional contra vítimas diretas e indiretas, com Marília Garcia Guedes, Anie Rampon, Jaqueline Gontijo, além de representantes da sociedade civil.
3: Paz no trânsito – propostas para a segunda onda, com Luiz Vicente Figueira de Mello Filho (UNICAMP), Cristovam Buarque, Ana Carboni (Rodas da Paz) e Ana Júlia Pinheiro (jornalista).
O encerramento será com uma roda de conversa entre instituições para construir conjuntamente um protocolo de atendimento às vítimas de crimes de trânsito.