Comportamento

Perfis privados e pressão digital: monitoramento e diálogo com jovens são importantes

Jovens fogem da superexposição nas redes e criam perfis privados para escapar da pressão digital, mas especialistas alertam que proibir não é solução

O monitoramento das redes socias das crianças e adolescentes é essencial  -  (crédito: Reprodução/ Freepik )
O monitoramento das redes socias das crianças e adolescentes é essencial - (crédito: Reprodução/ Freepik )

A presença on-line, por meio das redes sociais, tornou-se quase inevitável. Para os jovens em especial, estar conectado é essencial, é onde se encontram, se expressam, buscam informações e se comunicam. E é inegável que as plataformas oferecem um espaço para construir e manter relações, compartilhar experiências e desenvolver uma identidade, seja ela on-line ou não.

Mas um fenômeno traz um revés a essa interpretação, em que os jovens estão cada dia mais recorrendo a contas privadas e com poucos seguidores. Como é o exemplo dos chamados dix e daily — perfis alternativos e discretos, criados para publicar e compartilhar conteúdos destinados a um grupo seleto de amigos, longe do olhar atento de familiares, professores ou outros adultos. Essa prática mostra uma tentativa de organizar o que é exposto, criar espaços com menos interferência externa e maior sensação de autenticidade. Mas por que a mudança?

O advento dos chamados "influencers", pessoas que adquiriram ou desenvolveram sua fama por meio da internet e se utilizam das redes para expressar opiniões e influenciar outros, traz uma nova visão sobre o comportamento on-line, o que antes era um espaço comunicativo e de relações ou a ser repleto de pressões sociais, métricas de engajamento e padrões idealizados de sucesso. O comportamento on-line virou uma performance.

Nesse contexto, o "exibicionismo digital", o desejo de se mostrar na internet, ganha um novo contorno. Impulsionado pela busca por aceitação, reconhecimento e pela necessidade de construir uma imagem on-line atrativa, muitos jovens se sentem obrigados a projetar versões idealizadas de si mesmos. Esse comportamento se intensifica nesse ambiente em que a pressão social e a comparação são amplificados pela exposição constante e pela busca por seguir modelos de sucesso virtual, a busca por uma imagem "perfeita" para se projetar ao mundo.

os jovens estão cada dia mais recorrendo a contas privadas e com poucos seguidores
Os jovens estão cada dia mais recorrendo a contas privadas e com poucos seguidores (foto: Unsplash/ Andrey K)

O pedagogo Welton Dias de Lima, professor do Centro Universitário Uniceplac, realizou uma pesquisa que traz luz a essa realidade. Ao investigar o comportamento de estudantes do ensino médio, identificou que muitos usam esses perfis privados como uma válvula de escape, uma estratégia para aliviar a pressão por desempenho, aparência e aceitação nas redes.

A presença digital influencia os laços sociais de forma positiva, mas também negativa, exclusões, disputas por atenção e mal-entendidos também ocorrem nesses ambientes. Além disso, a internet mudou a forma de se comunicar. Muitos adolescentes preferem postar ou mandar mensagens curtas em vez de conversar frente a frente", observa o professor.

Como os pais devem agir?

Antes de tudo, é essencial que os pais compreendam que a vida digital faz parte da vida real dos adolescentes. A tecnologia já se faz presente em tudo o que fazemos e escapar das redes sociais é quase impossível. O medo e a preocupação que ronda a mente de muitos pais são a exposição inadequada, o cyberbullying, a privacidade ou até casos mais sérios, como assédio. Algumas vezes, o completo desligamento pode parecer a opção mais segura. Mas, ao pensar em como agir para promover a segurança on-line dos filhos, a proibição seria o caminho contrário a seguir.

Rodrigo de Aquino é especialista em felicidade e bem-estar, e diz que não se trata de proibição, mas de ensinar limites. "O relacionamento entre pai e filho tem que ser entre adulto e adolescente, cabe ao adulto não restringir, mas ensinar o que é seguro e o que não é, mostrar onde é o limite. É impossível exigir do jovem ou da criança a habilidade cognitiva para distinguir o certo e o errado, se não for ensinado a ele essa distinção", explica Rodrigo.

O especialista explica que é, sim, necessário olhar as redes sociais com muita cautela e critério, por serem consideradas como "terra de ninguém", mas criar uma ponte de confiança parental é ainda mais preciso. "O jovem precisa ter segurança em poder pedir ajuda quando se depara com algo com o que não consegue lidar, quando vê algo que não queria ver na internet, ou quando recebe alguma mensagem."

Demonstrações de escuta ativa, empatia e diálogo aberto são os fundamentais a serem dados pelos pais ao se tratar disso. Em vez de adotar uma postura controladora ou punitiva, o ideal é estabelecer uma relação de confiança, na qual o jovem se sinta seguro para compartilhar suas experiências, inclusive as on-line.

Promover conversas sobre os impactos emocionais da exposição excessiva, os riscos da comparação constante e a importância do autocuidado digital pode contribuir para uma relação mais saudável com a tecnologia. Rodrigo também fala sobre incentivar momentos de desconexão, de valorizar as interações presenciais, que podem ajudar a equilibrar o tempo de tela e fortalecer habilidades sociais.

"Os jovens mal sabem mais como interagir fora do âmbito on-line, e quando os pais também não se desconectam, chegam do trabalho e ficam no celular, promovem a ideia de que as interações presenciais são menos importantes", explica.

Uso proibido

Esse debate também se estende ao ambiente escolar, onde a presença constante dos dispositivos móveis tem levantado questionamentos sobre os impactos no rendimento acadêmico, na concentração e no convívio social. Em janeiro deste ano, foi sancionada a lei que proíbe o uso de aparelhos eletrônicos portáteis nas escolas e, embora o Ministério da Educação (MEC) ainda não tenha regulamentado a lei, as escolas já tomaram iniciativa e adotaram políticas de restrição ou proibição total do uso de celulares em sala de aula, com o objetivo de melhorar o foco dos alunos e resgatar as interações presenciais.

 

O uso excessivo de aparelhos eletrônicos atrapalha o rendimento escolar
O uso excessivo de aparelhos eletrônicos atrapalha o rendimento escolar (foto: Reprodução/ Freepik )

Embora essas medidas possam, em certa medida, reduzir a distração e estimular o engajamento pedagógico, proibir sem dialogar é uma solução superficial. É preciso educar para o uso responsável, ensinar que o digital pode ser uma ferramenta de aprendizagem e não apenas de entretenimento.

Aquino diz que, apesar da ausência já ter feito diferença, é necessário que as instituições saibam lidar com essa falta e estejam preparadas para preencher o tempo e a atenção dos alunos. "As escolas precisam ter a oferta de substituição, ter a criatividade de voltar a engajar os jovens, e a escola também tem um papel formativo fundamental nesse processo. Precisa incorporar o debate sobre ética digital, privacidade, saúde mental e cidadania virtual, não depende apenas dos pais, é preciso uma aldeia para educar uma criança."

Afinal, os jovens continuarão conectados fora do ambiente escolar, e o que fazem nesses espaços precisa ser orientado, não ignorado. Para especialistas, a questão não é demonizar o celular, mas ensinar quando e como usá-lo com discernimento.

*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte

 


  • Os jovens estão cada dia mais recorrendo a contas privadas e com poucos seguidores
    Os jovens estão cada dia mais recorrendo a contas privadas e com poucos seguidores Foto: Unsplash/ Andrey K
  • O uso excessivo de aparelhos eletrônicos atrapalha o rendimento escolar
    O uso excessivo de aparelhos eletrônicos atrapalha o rendimento escolar Foto: Reprodução/ Freepik
postado em 18/05/2025 06:00 / atualizado em 18/05/2025 06:00
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