Moda

De mãe para filha! A moda como herança entre as gerações

Para além dos looks charmosos e elegantes, a moda também é uma forma de preservar memórias e contar histórias. Assim, filhas guardam — e usam — roupas herdadas das mães

Para Luiza, essas roupas são cheias de sentimento -  (crédito: Vivi Morais)
Para Luiza, essas roupas são cheias de sentimento - (crédito: Vivi Morais)

As roupas contam histórias. Seja do ado, seja de alguém que a usou. Mais do que parte de uma estética ou de uma identidade visual, elas são a extensão da personalidade de uma pessoa, bem como de suas paixões e interesses. Continuar transmitindo essa mensagem, guardando-a com carinho no guarda-roupa, é o que muitas jovens mulheres fazem, especialmente para recordar com afeto essas lembranças deixadas pelas mães. Dos brincos aos vestidos, a moda também é uma memória a ser preservada. 

Colares, anéis, sapatos. A lista pode ser vasta e recheada de itens. Fato é que as roupas acompanham seus usuários ao longo do tempo. Quem nunca guardou o primeiro calçado usado pelo filho que atire a primeira pedra. Esses elementos são como uma viagem no tempo, ada de mãe para filha. Mas, não se engane, se bem conservados, podem ser usados tranquilamente, combinado, até mesmo, com o vestuário atual. Para o stylist e produtor de moda Fernando Lackman, o segredo está no equilíbrio adotado no presente.

"Peças do ado trazem consigo uma linguagem estética e simbólica que precisa dialogar com o agora. É fundamental entender o tempo da peça e refletir em como usar com elementos de hoje. Um blazer dos anos 1980, por exemplo, pode ganhar nova vida se combinado com uma camiseta básica, jeans de corte moderno e órios minimalistas", destaca. Misturar proporções também é uma boa ideia, juntando uma saia vintage com um tênis atual.

Contudo, para que a usabilidade desses itens esteja em dia, é necessário armazená-los bem, para que não percam a vivacidade de suas cores e a qualidade de seus tecidos. "Guarde as peças de alfaiataria penduradas em cabides estruturados; tecidos delicados, como seda ou renda, devem ser dobrados com papel de seda, ou as conhecidas capas de tecidos. Importante manter essas peças em ambientes arejados, longe de umidade", detalha.

De acordo com o profissional, Brasília é ótima para a preservação de roupas, pois o clima seco auxilia, em termos, na conservação. "Peças em couro, precisam de hidratação, e tecidos leves e finos merecem ser lavados a seco", completa. Na visão de Fernando, esses itens que atravessam gerações são atemporais e carregam as emoções de quem os usou. Mais do que isso, nesse período de hiperconsumo, revelam o valor de tudo aquilo que permanece, enquanto todo o resto se denuncia volátil.

Mais que uma memória

O preço dessas memórias é inestimável. Não há nada que pague ou apague essas recordações, especialmente para aqueles que, hoje, são os novos donos dessas roupas. Luiza Ceruti, 26 anos, perdeu a mãe em 2022. Nesse montante de saudade, a arquiteta guarda com carinho o vasto vestuário deixado não como herança, mas como um presente que a jovem pretende levar para o resto da vida.

"Essas roupas trazem memórias dos lugares que fomos e fizemos juntas. É algo que me mantém sempre próxima dela, de certa forma. Essa semana, por exemplo, vou fazer uma viagem importante para mim, penso que vou levá-la comigo, por meio de algumas roupas que vou usar que eram dela. Tenho algumas peças como casacos, blusas. O que mais uso são casacos, brincos e anéis", conta Luiza.

Por não vestirem o mesmo manequim, determinadas roupas ela guarda apenas para "sentir o cheiro", deixando-as bem armazenadas para que não acabem se desfazendo com o tempo. Das que a arquiteta consegue usar, faz uma mistura de peças que também combinam e conversam com a sua verdade, sem deixar a personalidade da mãe de lado. "Não tínhamos o estilo parecido, então sempre misturo de um jeito que resgata a memória dela, sem que eu perca a minha individualidade", ressalta.

Aproveita, em especial, os órios, os quais ela gostava bastante, sobretudo dos mais extravagantes. "Sou muito básica, gosto de usar preto e tons neutros. Mas minha mãe tinha uns brincos grandes e coloridos, por exemplo, que é o que eu mais uso quando quero dar mais vida ao visual", detalha a arquiteta. Além disso, tem uma paixão inenarrável pelas peças de alfaiataria da década de 1980, que a mãe adorava de coração. São de cortes e uma qualidade que, segundo Luiza, são difíceis de achar atualmente.

No futuro, caso tenha uma filha, espera que a pequena também desfrute, ao menos um pouco, desse presente que Luiza recebeu. Assim, esse amor se estabelece pelas gerações, fazendo da moda um lugar para se criar e pertencer. "Para mim, as pessoas se mantêm vivas por meio das memórias que ficam, e muitas delas estão materializadas nos objetos, peças de roupa que tinham um valor especial. Rear esses objetos, esse vestuário para futuras gerações é perpetuar essa memória", acrescenta.

Marcas do tempo

Para a professora de moda e stylist Nina Stellato, a combinação entre estilos diferentes pode ser fundamental caso queira deixar o look vibrante, incluindo uma roupa herdada da mãe. "Isso pode deixar a estética mais interessante, trabalhando o hi-lo. Ou seja, pode trazer peças atuais mais modernas com as vintage. Eu mesma tenho muitos itens que eram da minha avó e da minha mãe no meu acervo. Misturo, por exemplo, bolsa clutch com jeans ou camisas de seda em um look com tênis", afirma. 

Assim, além de conseguir uma ótima resposta com essa mistura, ainda carrega um componente para lá de especial: memórias e afeto. De certo modo, Nina acredita que esses elementos representam história, cultura e arte, pois possuem um valor que não se encontra em lojas ou no famoso fast fashion. Carregam marcas do tempo e contam história sobre estilo de vida. 

Mais do que isso, contam detalhes a respeito de uma outra época, como as pessoas nesse período se vestiam e o que elas queriam se expressar com tal estilo. "Simbolizam tradição e raízes. Ainda tem a questão da sustentabilidade no uso das peças que é essencial. Na minha opinião, roupas não são descartáveis. Usá-las também é importante, já que sem a utilização tendem a estragar", complementa.

Roupas com afeto

"Viviane", esse é o colar que leva o nome da mãe de Gabriela Ferreira, 26, que morreu em 2004. Para a advogada, entre tantos órios herdados, esse é o que ela mais gosta, ainda que não o use com frequência. "Guardo na esperança de um dia eu ter uma menina. É um colar de ouro. Se um dia tiver uma filha, gostaria de chamá-la de Viviane em homenagem à minha mãe e daria o colar para ela", confessa.

A advogada herdou, além de colares, brincos e pulseiras. Guardando cada item com muito carinho, pois representam, para ela, um pedacinho da mãe que pode carregar consigo no dia a dia. Esses pequenos gestos são maneiras simbólicas — mas muito poderosas — de eternizar o amor que as pessoas sentem.

Com isso, os utiliza com muita constância, já que são órios delicados que combinam com quase tudo. Para preservá-los bem, vira e mexe Gabriela os separa e manda para um lugar específico, pensando em uma limpeza profunda dos itens. De forma geral, também os guarda em um porta-joias, na companhia de outros órios que possui. Assim, entre ado e presente, ela vê em cada peça uma forma de manter a mãe por perto. 

  • Luiza usando uma calça da década 
de 1980, que era 
de sua mãe
    Luiza usando uma calça da década de 1980, que era de sua mãe Foto: Vivi Morais
  • Luiza acredita que usar as roupas é uma forma de lembrar da mãe
    Luiza acredita que usar as roupas é uma forma de lembrar da mãe Foto: Vivi Morais
  • O colar com o nome da mãe é o ório que Gabriela mais gosta
    O colar com o nome da mãe é o ório que Gabriela mais gosta Foto: Fotos: Arquivo pessoal
  • Gabriela herdou muitos órios
    Gabriela herdou muitos órios Foto: Arquivo pessoal
  • Entre colares e brincos, vários anéis são usados por Gabriela
    Entre colares e brincos, vários anéis são usados por Gabriela Foto: Arquivo pessoal
  • Gabriela afirma que consegue usar bem esses órios no dia a dia
    Gabriela afirma que consegue usar bem esses órios no dia a dia Foto: Arquivo pessoal
postado em 11/05/2025 06:00 / atualizado em 11/05/2025 08:41
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