
O plenário do Senado deve votar, nesta quarta-feira, o projeto de lei que modifica a concessão de licenciamento ambiental no Brasil e cria a Lei Geral do Licenciamento Ambiental. O PL 2.159, de 2021, foi aprovado nesta terça-feira em duas comissões: a de Meio Ambiente e a de Agricultura e Reforma Agrária.
Desde a década de 1980, o Congresso discute a centralização das normas para o licenciamento ambiental. A unificação já foi defendida por ambientalistas, que consideram positiva a adoção de regras claras e centralizadas, pois o licenciamento ambiental é obrigatório no Brasil a todos os empreendimentos ou atividades que possam causar algum tipo de poluição ou degradação do meio ambiente.
O lobby de parte do empresariado e de parte do agro, no entanto, pesou nas discussões ao longo dos anos. O texto discutido no Senado foi aprovado na Câmara em 2021 depois de 17 anos de tramitação.
Entre as novidades, está a criação da Licença Ambiental por Compromisso (LAC), que na prática é um autolicenciamento a pequenos e médios empreendimentos considerados de menor impacto.
Durante a sessão da CMA que aprovou o texto, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) lembrou que a barragem da mineradora Vale em Brumadinho (MG), que rompeu em 2019 e matou 272 pessoas, era considerada de médio porte. Segundo um relatório da Controladoria-Geral do Estado de Minas Gerais, a barragem foi ampliada duas vezes sem obter novos licenciamentos ambientais, processo que era obrigatório.
"(A barragem de) Brumadinho era de médio porte. Nós temos vários empreendimentos, não apenas em Minas Gerais, mas em outros estados, que são de médio porte", pontuou Eliziane Gama. Para a senadora, mesmo que o texto seja aprovado no Congresso, será barrado no Supremo Tribunal Federal (STF), porque vai na contramão das políticas estatais de conservação ambiental.
"Essa legislação será fatalmente barrada no Supremo Tribunal Federal por vício de inconstitucionalidade. Esse projeto, que é a Lei Geral do Licenciamento Ambiental, vai afrouxar a legislação brasileira e abrir brechas grandes e gritantes para, infelizmente, ter a possibilidade de se repetir o que nós já vivenciamos no Brasil: tragédias gigantes que impactaram não apenas o Brasil, mas o mundo, como foi o caso de Brumadinho", frisou a congressista.
Na Câmara, os deputados haviam retirado a obrigatoriedade de inclusão de empreendimentos de mineração de grande porte e de alto risco — o que inclui as barragens nessa classificação. Na versão aprovada na Casa, seria o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) a lidar com essas atividades. O relatório da senadora Tereza Cristina (PP-MS) trouxe os empreendimentos de volta à Lei Geral do Licenciamento.
Relatora rebate
Durante evento da FPA nesta terça-feira, Tereza Cristina rebateu as críticas sobre potenciais riscos a barragens. "As barragens têm uma lei de barragens que dizem que é uma das melhores do mundo, tanto é que mudou a técnica de barragens no Brasil. Então, nós precisamos evoluir. O que temos de projetos parados no campo de energia é um problema seríssimo", declarou.
A senadora também defendeu a necessidade de aprovar uma legislação unificada para o tema. "Hoje nós não temos um marco do licenciamento ambiental, o que nós temos é um emaranhado de instruções normativas, de leis estaduais, que cada um fala uma coisa. (...) O projeto destrava, traz simplificação, mas não traz fragilização da lei. As punições, inclusive, são mais duras do que o que há hoje", sustentou.
Na segunda-feira, o Ministério Público Federal entregou à Comissão de Meio Ambiente um documento em que expressava preocupação com o projeto de lei. Alertou, por exemplo, que o texto desconsidera territórios indígenas e tradicionais sem homologação e também o possível impacto de atividades industriais em áreas próximas. Pediu, portanto, a readequação do texto para atender à "proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado e aos direitos territoriais e culturais dos povos indígenas, quilombolas e povos e comunidades tradicionais". O pedido foi ignorado, e o texto ou na CMA mantendo os pontos polêmicos.
- Especialistas criticam novo licenciamento ambiental, em discussão no Senado
- Ambientalistas denunciam boiada no Senado
- Marina Silva está sozinha contra o licenciamento ambiental
Retrocesso
Organizações ambientais têm se manifestado em peso contra o projeto de lei. O Greenpeace criticou nesta terça-feira a tramitação acelerada da proposta. Para Mariana Mota, gerente política da entidade, a aprovação da nova legislação vai no sentido contrário à agenda ambiental que o governo federal quer exibir na COP 30, a ser realizada este ano em Belém.
"Enquanto o Brasil se prepara para ser palco mundial de discussões e soluções para a crise climática, o Senado Federal decidiu que a prioridade nacional é desmontar o licenciamento ambiental. Isso não é apenas um retrocesso, é um atestado de que a política brasileira segue refém de um projeto de poder que troca direitos por danos e prevenção por tragédia anunciada", disparou.
Na semana ada, o Observatório do Clima já havia publicado uma nota técnica apontando uma série de inconstitucionalidades no texto do projeto de lei. "Ao priorizar de forma irresponsável a isenção de licenças e o autolicenciamento, a proposta tem potencial de agravar a degradação ambiental, representando grave ameaça a direitos humanos fundamentais", frisou. "A flexibilização dos estudos, das condicionantes ambientais e do monitoramento pode resultar em desastres e riscos à saúde e à vida da população, com a contaminação do ar, dos solos e dos recursos hídricos", alertou a entidade.
Apesar das críticas de ambientalistas, há quem considere a proposta positiva no primeiro escalão do governo Lula. O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, defendeu nesta terça-feira a aprovação do texto. Disse, durante uma reunião da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), que o projeto vai "provocar o desenvolvimento do país".
Fávaro também afirmou que há apoio ao texto dentro do Executivo e destacou que conversaria com o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), para obter respaldo.
Wagner, no entanto, votou contra o projeto na Comissão de Meio Ambiente nesta terça-feira e disse que o governo Lula "ainda não tem uma posição definitiva" sobre o assunto. Prova disso é que a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse, em 8 de maio, que o texto do marco do licenciamento ambiental é um "retrocesso" e um "desmonte".
Algumas das principais frentes parlamentares da Câmara também defendem a proposta. Em um manifesto divulgado nesta terça-feira, grupos como a FPA, a Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE) a Frente Parlamentar pelo Livre Mercado, defenderam a aprovação da proposta.
"O Brasil precisa urgentemente de um ambiente mais propício e seguro ao investimento, à geração de empregos e ao desenvolvimento sustentável. A burocracia excessiva, a insegurança jurídica e os entraves à iniciativa privada vêm obstruindo o crescimento do país, afastando investidores e penalizando empreendedores de todos os portes", diz o documento.
Especialista em direito ambiental, Maria Christina Gueorguiev, sócia da área de Ambiental e Mudanças Climáticas do Veirano Advogados, explicou que a LAC busca dar agilidade ao licenciamento, mas levanta dúvidas quanto à sua eficácia preventiva. “Há a justa expectativa do setor empresarial e também do governo de dar maior celeridade ao licenciamento (…), mas, mesmo nos casos da LAC, o órgão ambiental poderá fiscalizar a implantação e operação do empreendimento”, ressaltou.
Saiba Mais

Israel Medeiros
RepórterSetorista no Congresso Nacional. Foi editor no Poder360, analista político e tem agens pelo Brasil 61 e TSE. Tem especialização em macroeconomia e finanças internacionais.