
Com o traquejo de quem está há mais de quatro décadas na política, o ministro da Previdência, Carlos Lupi, enfrentou, nesta terça-feira, uma série de questionamentos sobre o escândalo do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e ainda saiu por cima. O ex-presidente do PDT foi chamado à Comissão de Previdência e Assistência Social da Câmara para prestar esclarecimentos sobre o desvio de dinheiro de aposentados. Negando qualquer participação no esquema criminoso, foi enfático e disse, reiteradas vezes, que os responsáveis pelos golpes têm de ir para a cadeia, independentemente de quem sejam.
Embora a oposição tenha marcado presença na sessão, a atuação foi apagada, e Lupi conseguiu contornar as cobranças. A pergunta mais repetida pelos deputados foi: "Por que o senhor demorou tanto para tomar medidas?". Com tom educado e de camaradagem, Lupi disse aos parlamentares que agiu prontamente quando o Ministério da Previdência apontou as irregularidades, em 2023, e que chegou a demitir um diretor em 2024 por sua lentidão em tomar providências sobre o assunto.
O ministro afirmou que, embora tenha tentado resolver a situação rapidamente, foi impedido pela burocracia do Estado e do ministério, que ele disse considerar morosa. Argumentou, também, que o processo de verificação de s (os golpistas utilizaram s falsas de beneficiários) é lento e complexo.
"Isso é igual ao processo judicial. Você não abre um inquérito hoje, e amanhã tem a solução. Não é assim. São 6 milhões, no mínimo, que fazem contribuição sindical. São 41 instituições. Vocês pararam para pensar como é que é analisar se é válido ou não analisar 6 milhões de s? Isso não é simples, é complexo", frisou. "Demorou? Sim. Eu não tenho vergonha nenhuma de dizer que eu gostaria que fosse muito mais ágil. Mas estamos agindo. Estamos fazendo. Está doendo na nossa carne. Estamos tendo que exonerar gente que trabalhava com a gente, que convivia com a gente."
Lupi também destacou ser doloroso ver pessoas com quem convivia no ministério serem apontadas como participantes no esquema bilionário de roubo dos aposentados. "Para mim, dói. Eu ver as pessoas que, até semana ada, eu tinha confiança, trabalhavam comigo, desenvolviam um trabalho que eu achava que era bom, envolvidas nisso. É um pavor, irmão. Um horror. Não conseguimos detectar", completou.
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Defesa
Ele voltou a afirmar que assume a total responsabilidade pela indicação do agora ex-presidente do INSS Alessandro Stefanutto, cuja demissão foi ordenada pelo próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva depois que o escândalo veio a público. O ministro até citou a história de Jesus para argumentar que "nem Cristo" escapou de escolher "um traidor" para seu grupo de discípulos.
"Nós temos uma sociedade que tem a vocação da esperteza. Todo mundo quer levar vantagem em tudo. Coibir isso, a gente tenta, a gente luta, mas é mentira dizer que isso se resolve em um estalar de dedos. Nem Cristo, que era filho de Deus e escolheu 12 apóstolos, se livrou de um traidor. Ele não tinha como… trair a Cristo? E era o Deus. Ele não tinha esse poder. Quem sou eu? Um ser humano falível", afirmou.
O titular da pasta também foi perguntado, por deputados, sobre a comparação que fez em uma reunião do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) na segunda-feira. Ele disse, na ocasião, que o INSS não é um botequim da esquina, onde se resolvem os problemas em 24 horas. Nesta terça, reforçou o posicionamento.
"É muito difícil você assumir essa responsabilidade e achar que vai resolver num estalar de dedos, como se fosse o botequim da esquina, uma instituição que tem 21 mil funcionários, agências em todo o Brasil. Tudo é complexo", argumentou.
Outro ponto abordado por Lupi foi a efetivação de descontos diretamente na folha de pagamento dos aposentados. O ministro ressaltou ser contra esse tipo de cobrança e defendeu um modelo em que os beneficiários façam os pagamentos a instituições voluntariamente, se assim desejarem. "Sou contra o INSS ter desconto. Eu acho que não tem que ter desconto de ninguém. Acho que as instituições têm de se entender com seus clientes e fazer a cobrança direta. Porque senão, daqui a um tempo, e não vai demorar, porque é incontrolável a quantidade, o Brasil é imenso, vai acontecer novamente", pontuou.
Apesar de estar em processo de fritura pública, Lupi recebeu o apoio dos representantes do governo na comissão. Deputados do PT e o próprio líder do partido na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), disseram conhecer o ministro e sua "índole". "Aqui todo mundo acha que quem cometeu o crime tem que pagar. Mas todo mundo aqui tem presunção de inocência. Você não pode, nos gritos, declarar uma pessoa acusada, quando não tem. Sabe o que saiu hoje (nesta terça-feira)? O inquérito da Polícia Federal com 1.541 folhas, com relatório financeiro, dinheiro saindo de uma conta e indo para outra. Pegou um bocado de gente, e não apareceu o nome dele. Então, primeiro, eu quero exigir respeito", disse Lindbergh.
O líder também argumentou que a investigação do INSS é uma prova de que as instituições estão funcionando sob o governo Lula. A apuração começou na Controladoria-Geral da União (CGU) {parte do Executivo} e evoluiu na PF.
Segundo a CGU, ao todo, entidades associativas descontaram mais de R$ 6 bilhões dos pagamentos feitos a aposentados e pensionistas de 2019 a 2024. O montante que foi desviado por golpistas, no entanto, ainda não foi calculado.
*Estagiária sob a supervisão de Cida Barbosa