
A organização World Press Photo (WPP), que anualmente premia trabalhos emblemáticos do fotojornalismo mundial, anunciou, na última sexta-feira (16/5), que “suspendeu” a atribuição de uma das fotos mais icônicas do século 20. A imagem, intitulada O terror da guerra, que se tornou símbolo a oposição ao conflito no Vietnã em 1972, quando foi tirada, era creditada, até então, ao fotógrafo aposentado da Associated Press (AP), Hunh Công "Nick" Út.
Conhecido também como Menina do Napalm, o registro mostra crianças — no centro delas, a hoje cidadã canadense Kim Phuc Phan Thi — fugindo de um ataque de napalm, um composto de líquidos inflamáveis à base de gasolina, lançado por aviões sul-vietnamitas em tropas e civis. Nomeada foto do ano em 1973 e depois agraciada com um Prêmio Pulitzer, a imagem teria sido capturada, segundo relatório que acompanha decisão da WPP, não por Út, mas por outro profissional.
O relatório, que apresenta evidências “visuais e técnicas”, aponta que a foto pode ter sido tirada por Nguyn Thành Ngh, um correspondente vietnamita da AP. Com o objetivo de garantir a transparência, a rigorosidade e a justiça de uma das mais importantes premiações do setor, os procedimentos da organização incluem “protocolos para reavaliar trabalhos premiados quando surgem novas evidências ou questões relevantes”.
O questionamento surgiu após o lançamento do documentário The stringer, que teve estreia no Festival de Sundance, em janeiro. Apoiada por pesquisas da The VII Foundation, a produção de Bao Nguyen põe em dúvida o fato de a imagem ter sido creditada à pessoa errada.
Depois de os direitos da fotografia terem sido colocados em pauta pelo cinema, a World Press Photo decidiu lançar a própria análise investigativa a respeito de O terror da guerra — o que também foi feito pela Associated Press. Todas as investigações concluem que a autoria é incerta e não tem evidências conclusivas.
“Nossa análise incluiu uma revisão completa tanto das conclusões do documentário quanto da investigação interna aprofundada da própria AP”, informa, em nota, a diretora executiva da WPP, Joumana El Zein Khoury. “Em casos complexos, reconhecer a dúvida, situar os eventos em contexto histórico e compreender as camadas da narrativa pode ser tão importante quanto afirmar uma verdade definitiva. Essa filosofia é especialmente crucial no âmbito do fotojornalismo e da fotografia documental.”
Após a conclusão, porém, cada uma das associações procede de forma diferente em relação ao tópico. “O documentário defende a posição de Nguyn Thành Ngh como autor”, enquanto a “Associated Press concluiu que, como não há prova definitiva de que Nick Út não tenha tirado a imagem, a atribuição da autoria a ele deve ser mantida”.
A World Press Photo, por sua vez, acredita que “o nível de dúvida é significativo demais para manter a atribuição existente”, mas que a ausência de evidências conclusivas que apontem para o outro fotógrafo não permite uma renomeação. “É uma resolução ponderada e baseada em princípios.”
Segundo a WPP, a abordagem “honra a complexidade da questão, permanece aberta a novos desenvolvimentos e, acima de tudo, convida ao diálogo crítico”. A esperança da organização é de que isso “ajude a fomentar conversas significativas sobre verdade, autoria e integridade na narrativa visual”.
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Na página oficial da imagem no site do World Press Photo, em vez do nome do fotógrafo, consta “autoria contestada”, sob a Associated Press. No lugar da biografia, explica-se que a “atribuição está agora sob sérias questões”.
“Devido a essa dúvida atual, a World Press Photo suspendeu a atribuição a Nick Út”, diz. “As evidências visuais disponíveis e a provável câmera usada naquele dia indicam que os fotógrafos Nguyn Thành Ngh ou Hunh Công Phúc poderiam ter tido uma posição melhor para tirar a fotografia.”
Apesar da dúvida acerca do autor e da suspensão dele, a fotografia segue incontestável e premiada pela WPP. Sob análise, é possível que o dono do clique nunca seja totalmente confirmado. “A suspensão da atribuição de autoria permanece, a menos que seja provado o contrário.”
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