América Central

Nicarágua: Peritos da ONU acusam 54 autoridades de graves violações

Relatório de especialistas das Nações Unidas aponta o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega; a esposa e vice, Rosario Murillo; juízes; militares e policiais por alimentarem a repressão e cometerem abusos dos direitos humanos

Vendedor de sorvete a em frente a outdoor com as fotos de Ortega e Murillo, em Manágua  -  (crédito: Inti Ocon/AFP)
Vendedor de sorvete a em frente a outdoor com as fotos de Ortega e Murillo, em Manágua - (crédito: Inti Ocon/AFP)

"A verdade pesa. Hoje, esse peso caiu sobre os responsáveis pela repressão na Nicarágua", declarou ao Correio Félix Maradiaga, ex-preso político e principal líder da oposição ao presidente nicaraguense, Daniel Ortega. Foi uma menção ao relatório do Grupo de Peritos em Direitos Humanos das Nações Unidas para a Nicarágua, que tornou públicos os nomes de 54 autoridades "responsáveis por graves violações dos direitos humanos, abusos e crimes, os quais alimentam uma campanha de repressão sistemática" no país da América Central. Entre eles, estão o próprio Ortega e a primeira-dama (e vice-presidente), Rosario Murillo, magistrados, deputados, militares e policiais. "Essa revelação histórica confirma o que nós, vítimas da repressão, temos denunciando durante anos: na Nicarágua, houve uma política de Estado deliberada, da ditadura sandinista, para silenciar a dissidência a qualquer custo", acrescentou.

De acordo com Maradiaga, o relatório dos especialistas da ONU é uma "radiografia precisa da sede de sangue da ditadura sandinista e de como ela estruturou o terrorismo de Estado". "O informe expõe, em 234 páginas, como o aparato repressivo do regime atuou de forma coordenada, desde as mais altas esferas de poder até os níveis locais", disse o líder opositor, por telefone."O ditador Daniel Ortega e a coditadora Rosario Murillo encabeçam a cadeia de comando da repressão junto a generais do Exército; o chefe da polícia sandinista, Francisco Díaz; juízes; e outros altos funcionários da ditadura, incluindo o presidente da Corte Suprema de Justiça, Marvin Aguilar." Também foram citados os líderes do Congresso e do Ministério Público. 

Carlos Fernando Chamorro, diretor da revista nicaraguense Confidencial e dissidente exilado na Costa Rica, disse à reportagem que o relatório representa "um grande desafio para os tribunais internacionais e a Justiça universal para que ponham em marcha processos criminais contra os responsáveis pela repressão". "Com o trabalho da imprensa independente e este relatório de especialistas da ONU, a Nicarágua está conseguindo restaurar a memória e a verdade, mas ainda há um longo caminho a percorrer para que se alcance justiça", opinou.

Em entrevista ao Correio, por e-mail, Reed Bródy — um dos peritos que assinam o relatório da ONU — elogiou o resultado do trabalho do grupo. "Pela primeira vez, estamos divulgando dezenas de nomes da máquina de repressão. Não se trata mais apenas de abusos e crimes — trata-se também das pessoas que os fizeram acontecer. O que expusemos é um sistema projeto para dominar e silenciar. Cada instituição foi cooptada para servir a essa meta", declarou. 

Para Bródy, mais do que um relatório, o documento é um "processo de responsabilização". "A comunidade internacional não deve simplesmente testemunhar, mas deve tomar medidas concretas — ações legais, processos e sanções específicas — para responsabilizar o governo e os perpetradores individuais", defendeu o especialista das Nações Unidas.  

Ex-guerrilheiro sandinista de 79 anos, Daniel Ortega governou a Nicarágua nos anos 1980, depois do triunfo da revolução, e está no comando do país desde 2007. Ele e Murillo se autodenominaram "copresidentes" depois de uma reforma constitucional e apertaram o cerco à oposição desde as manifestações de abril de 2018, que terminaram com mais de 300 mortos. Presidente do grupo de especialistas da ONU, Jan-Michael Simon, explicou à agência -Presse que o documento "expõe a anatomia de um sistema de governo que transformou cada braço do Estado em uma arma contra seu próprio povo". 

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Félix Maradiaga, ex-preso político nicaraguense, principal líder da oposição e presidente da Fundación para la Libertad de Nicaragua
Félix Maradiaga, ex-preso político nicaraguense, principal líder da oposição e presidente da Fundación para la Libertad de Nicaragua (foto: Arquivo pessoal )

"O mais revelador desse relatório é a demonstração de que a violência não foi resultado de questões individuais, mas de um sistema repressivo desenhado pela Presidência da Nicarágua e aplicado de forma sistemática."

Félix Maradiaga,ex-preso político e principal líder da oposição na Nicarágua

 

postado em 04/04/2025 06:02
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