
Sem técnico há 36 dias, a Seleção Brasileira vasculha o mercado da bola em busca de um nome com credenciais de peso para substituir Dorival Júnior. Simultaneamente, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) ameniza a sangria de uma crise sem precedentes. Com o "não" do italiano Carlo Ancelotti — obsessão e preferência do presidente Ednaldo Rodrigues para o cargo —, o vestiário da equipe nacional mais vencedora do mundo segue silenciado, sem voz de comando. O incômodo cenário, inclusive, abriu margem para outros treinadores soltarem o verbo sobre o momento da equipe. Os pitacos envolvem, até mesmo, características a respeito do nome ideal para guiar o sonho do hexacampeonato.
A lista é de peso e tem personagens com títulos da Série A do Campeonato Brasileiro e da Libertadores no currículo. Alijados do processo seletivo da sucessão de Dorival devido à escancarada preferência da CBF por um profissional estrangeiro para dirigir a Seleção, nomes como Cuca, Renato Gaúcho e Rogério Ceni assumiram papéis de porta-vozes da reflexão do momento conturbado da Amarelinha. Questionados por jornalistas, não titubearam. Marcado na história como um dos treinadores mais vitoriosos do país, Muricy Ramalho também deu declarações recentes sobre o tema.
Líder do Bahia, Ceni pediu independência no trabalho do próximo treinador da Seleção Brasileira. Embora corra por fora na lista de candidatos para assumirem o cargo, o profissional destacou o momento de felicidade à frente do tricolor baiano para minimizar a chance de chegar ao posto. O profissional preferiu ressaltar uma preferência pouco usual entre nomes da área: a de um estrangeiro para a função.
"Na Seleção, qualquer um que assuma vai precisar ter liberdade para trabalhar. Aí a Seleção vai ter, sem dúvida nenhuma, mais chance de ter sucesso. Quem deve vir é um treinador de fora que tenha capacidade e bagagem. Acho que já irão anunciar o escolhido. É importante que a CBF faça uma boa escolha. Como eu sempre falo, espero que deem liberdade para qualquer treinador. Existem bons profissionais, tanto no Brasil, quanto fora. Acho uma besteira não poder ser um treinador de fora", destacou, em entrevista coletiva após a vitória diante do Palmeiras, por 1 x 0, no Brasileirão.
Muricy Ramalho reforça o coro do antigo pupilo dos tempos de São Paulo. Em entrevista exclusiva ao Correio, o atual coordenador de futebol do tricolor paulista reforçou: a nacionalidade do futuro comandante da Amarelinha não fará diferença. O substituto precisa, somente, ter as credenciais necessárias para lidar com uma rotina muito diferente da vivida em clubes, onde existe uma sequência de semanas disponíveis para se construir ideias de jogo, colocá-las em prática e corrigir as necessidades, pontualmente.
"O técnico da Seleção Brasileira não tem esse dia a dia, tem dificuldade para extrair, às vezes, o que o cada um tem de melhor. Falta achar o time ideal, acreditar nesse time ideal, e fazer esse time jogar um pouco mais junto. Sou a favor de um bom técnico, não importa onde nasceu. Seria Roger Machado, Rogério Ceni, Filipe Luís, Abel Ferreira, Pep Guardiola. Não importa a ordem, ok?", reforçou Muricy. Cotado em outros tempos para o cargo, o profissional não chegou a viver a experiência de dirigir a equipe verde-amarela na carreira.
Críticas
Empregados no Fluminense e no Atlético-MG, Renato Gaúcho e Cuca assumiram tons mais críticos a respeito do atual momento da Seleção Brasileira. Restando pouco mais de um ano para a disputa da Copa do Mundo e com somente 10 jogos disponíveis até o Mundial dos Estados Unidos, do Canadá e do México — seis das Eliminatórias e quatro amistosos —, a dupla questiona o planejamento atual adotado pela CBF. Enérgico, o comandante tricolor assumiu: abdicaria do sonho para não se envolver na "bagunça" da entidade.
"Vou te falar sinceramente: se eu fosse chamado para a Seleção agora, eu não iria. Com todo o respeito. Nessa bagunça, eu não vou entrar, não. A Seleção Brasileira é meu sonho, mas a CBF precisa tomar vergonha na cara. A verdade é essa. Eu não quero chegar na Seleção Brasileira e ser mais um", desabafou Renato, em entrevista ao ge.globo. Com ousada sugestão de "abrir mão" do Mundial de 2026, Cuca levantou uma reflexão: haverá tempo para o substituto trabalhar? "Vão deixar o treinador ficar para a outra Copa se não ganhar? São processos que têm que existir, riscos que têm que correr. Se não tiver esse pensamento, essa cabeça, dificilmente vai ganhar. O Brasil pode ganhar essa Copa, mas a tendência é maior para não ganhar do que ganhar", indicou.
O futuro
Sem Carlo Ancelotti, a CBF segue inclinada a ter um técnico estrangeiro na Seleção Brasileira. Dois portugueses despontam no favoritismo: Jorge Jesus, do Al-Hilal, e Abel Ferreira, do Palmeiras. O ex-técnico do Flamengo garantiu diversas vezes: aceitaria prontamente um possível convite. Comandante mais longevo em clubes do futebol nacional, o palmeirense falou, ontem, sobre o tema. Mesmo superficialmente, deu indícios de como avalia a chance. "Há um lema na bandeira do Brasil de que gosto muito: Ordem e Progresso. É algo com que me identifico muito aqui no Palmeiras, é isso que fazemos aqui dentro. Claro que é uma honra ter seu nome associado a uma das melhores seleções do mundo. Mas tenho contrato com o clube, o meu foco é total e absoluto com meus jogadores, com o Palmeiras", garantiu.