
O Lago Paranoá é o ecossistema mais importante da capital e um dos principais patrimônios ambientais e culturais do Distrito Federal, desempenhando papel vital na qualidade de vida da população de Brasília. Além de ser um reservatório estratégico, ele ameniza a baixa umidade, ajuda na regulação térmica da cidade, contribui para a geração de energia elétrica e para a captação de água para consumo humano. Também serve de espaço de lazer para a população e abriga diversas espécies de plantas e animais silvestres. Apesar disso, o local ainda não conta com uma política contínua de monitoramento integrado da biodiversidade de sua fauna e flora, além de evitar uma exploração predatória.
De acordo com o Instituto Brasília Ambiental (Ibram), o Lago Paranoá é amplamente estudado, sendo, inclusive, objeto de um livro com capítulos dedicados à fauna e à flora. No entanto, os últimos estudos relevantes foram realizados na década de 1990 e no início dos anos 2000. O órgão afirma que, atualmente, tem buscado maior alinhamento com as universidades do DF, com o objetivo de fomentar pesquisas que respondam a problemas ambientais latentes e promovam a adoção de políticas públicas de curto, médio e longo prazos.
Como exemplo, o Ibram cita o estudo Brasília Ambiental, realizado em parceria com a Secretaria do Meio Ambiente (Sema/DF), a Secretaria de Saúde (SES/DF) e a Universidade Católica de Brasília. A pesquisa monitora a população de capivaras na região e em outros pontos estratégicos, além de coletar e analisar carrapatos-estrela, com o intuito de identificar quais bactérias estão circulando nessa área.
- Acusado de duplo feminicídio em Luziânia havia matado duas travestis em 2012
- Quadrilha do Sul que aplicava golpe do bilhete premiado é alvo da PCDF
"Nesse sentido, ao mesmo tempo em que trabalhamos na prevenção para que zoonoses importantes não ocorram na região, aproveitamos a oportunidade para trazer esclarecimentos à população sobre a necessidade de haver respeito mútuo entre as espécies de animais silvestres que habitam o lago", explica Janaína Starling, diretora de conservação do Ibram.
O órgão também realiza fiscalização ambiental e controle de impactos por meio do licenciamento, além de participar de programas como o Drenar DF, que visa melhorar o escoamentos de água da cidade e reduzir a carga poluidora lançada nos corpos hídricos. "Acompanhamos projetos de recuperação ambiental com plantio de espécies nativas para recompor as Áreas de Preservação Permanente (APPs) e ampliamos o programa de monitoramento da qualidade da água nas unidades de conservação, incluindo áreas complementares àquelas monitoradas pela Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) e pela Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa)", completa Janaína.
Necessidade
Pedro de Podestà Uchôa de Aquino, professor do Departamento de Ecologia (ECL) da Universidade de Brasília (UnB) e especialista em ecologia do Lago Paranoá, afirma que é estritamente necessário mapear a fauna e flora do lago para conhecer como o sistema funciona. "Esse entendimento é fundamental para planejar qualquer ação de interesse, seja voltada à preservação, seja relacionada a algum tipo de uso do lago", ressalta.
Reuber Brandão, professor do Departamento de Engenharia Florestal da UnB e doutor em ecologia, defende que o monitoramento da fauna e flora do Lago Paranoá deveria ser realizado anualmente ou a cada dois anos. Segundo ele, essas informações são cruciais para diversos aspectos, especialmente no que diz respeito ao uso público do local.
- "É um trauma que vai ficar para sempre", diz vítima de gravações no banheiro
- Caminhão-tanque tomba, atinge carro e motos e deixa um morto e três feridos
"Observa-se, por exemplo, a preocupação crescente das pessoas com a presença de determinados animais no lago, muitas vezes associada ao desconhecimento. Casos de alarmismo nas redes sociais sobre a presença de jacarés e capivaras são um exemplo disso", detalha.
O professor também destaca o risco de transmissão de zoonoses, pois a presença de certos animais pode representar ameaças sanitárias. Além disso, mudanças na vegetação aquática precisam ser acompanhadas, pois algumas plantas não comuns no DF têm surgido no lago, enquanto espécies nativas estão se proliferando de maneira atípica, como resposta às alterações ecológicas do ambiente.
José Orlando Fernandes, de 65 anos, morador do Guará, conta que frequenta o Lago Paranoá há muitos anos. Apesar da presença de jacarés e dos recentes episódios envolvendo capivaras, ele afirma não ter medo dos animais. No entanto, destaca a importância de estudos sobre a fauna ao relembrar um episódio ocorrido na orla do Lago Norte: após ar uma tarde em uma área com grande concentração de capivaras, ele e outras pessoas notaram a presença de carrapatos no corpo.
Proteção ambiental
Atualmente, o Ibram é responsável por quatro Áreas de Proteção Ambiental (APAs): APA da Bacia do Rio São Bartolomeu, APA das Bacias dos Córregos Gama e Cabeça de Veado, APA de Cafuringa, APA do Lago Paranoá. Segundo a legislação brasileira, esses espaços são áreas com algum grau de ocupação humana, mas que apresentam atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais relevantes para a qualidade de vida da população. Os objetivos principais são proteger a diversidade biológica, disciplinar o uso e ocupação do solo e assegurar a sustentabilidade na utilização dos recursos naturais.
A APA do Lago Paranoá visa preservar os ecossistemas característicos do Cerrado, como as várzeas e matas ciliares que margeiam os rios e córregos que deságuam no lago. A ideia é conservar a natureza da região, incluindo os animais, plantas e o solo. A APA também atua na recuperação da vegetação das margens desses córregos, contribuindo para a melhoria da qualidade da água e a redução da poluição e do acúmulo de sedimentos. Além disso, há um esforço para proteger os ninhos de aves aquáticas e seus locais de descanso, bem como oferecer espaços de lazer e contato com a natureza, unindo preservação ambiental e bem-estar da população.
Poluição
Reuber Brandão, da UnB, explica que, ao pensar nos impactos ambientais sobre o Lago Paranoá, é comum responsabilizar diretamente a população. No entanto, segundo ele, as políticas públicas de ocupação do território no Distrito Federal têm um impacto muito mais significativo sobre a sustentabilidade do lago do que o uso recreativo da população.
Enquanto o uso público demanda cuidados básicos — como não jogar lixo, não desmatar, não caçar ou causar danos diretos ao meio ambiente — os impactos mais graves estão ligados à forma como o território é ocupado e gerido. "O tratamento de esgoto, o controle de ligações clandestinas, o despejo de efluentes (resíduos líquidos) não tratados, o desmatamento das margens, a degradação dos afluentes e o acúmulo de sedimentos comprometem seriamente a qualidade da água e o equilíbrio do ecossistema", pontua.
- Caesb divulga alerta sobre sites falsos que imitam o da companhia
- Audiência Pública vai discutir planos de modernização para o Metrô-DF
João Victor Martins, 23, nascido e criado em Brasília, conta que, apesar de frequentar as margens do lago para lazer, não tem coragem de nadar no local. "A gente sabe como funciona essa questão do saneamento aqui no lago. Dá um certo desgosto entrar na água, porque ela tem esse aspecto estranho, às vezes, está com um cheiro ruim. Fico com receio de que a qualidade não seja boa", relata.